O DIA EM QUE VI A CARA DA MORTE
(PELA PRIMEIRA VEZ)
Dias antes. No dia 24 de outubro de 1993 escalamos a Face Leste do
Pico Maior, foram duas cordadas uma formada por mim e Dário do Nascimento (foto: Dário e André no cume do Pico Maior) e a
outra por Joel Novo e Leonardo Amorim da Silva. (Nem sabíamos neste dia, mas
nos tornaríamos 4 dos nomes mais importantes da escalada friburguense nos anos
seguintes com diversas conquistas e viagens a Alta Montanha.) Cito esta
escalada, pois, tudo começou neste dia ao chegarmos ao cume do Pico Maior, após
comemorarmos o fato de Dário chegar pela primeira vez a este cume, Joel resolveu retirar uma corda que estava fixa na parte final da via (ainda em
conquista) Filhos da Terra, essa retirada foi feita a pedido de Leandro Gama
“Japão” um dos conquistadores da via. A corda havia passado mais de um ano
pendurada na montanha com uma marreta de 1 kg em sua ponta, ou seja, além de
toda a ação do sol ela ainda estava sofrendo lentamente com a ação da marreta
esticando-a. Retirada e guardada a corda, rappelamos o Pico Maior e retornamos
para Nova Friburgo.
Phobus e a corda rangendo. Dia 27 de outubro de 1993, ou seja 3
dias após retirarmos a corda do Pico Maior a pedido de Joel, resolvemos testar
a corda, mas resolvemos testar a corda logo na via Phobus, uma linda fenda que
na época havia sido conquista com dezenas de grampos, mas que ainda sim era uma
escalada aérea e totalmente exposta, seu livro de cume estava há mais de 100
metros em desnível da base e sua parede totalmente em 90º. Nesta época tínhamos
cordas dinâmicas há pouco mais de 6 meses, então para nós utilizarmos uma corda
“bacalhau” e que havia passado mais
de ano numa montanha não parecia ser problema algum. Então após nos encordarmos
e Joel guiar a primeira enfiada até a saída do teto eu comecei a perceber algo
de estranho na corda, ela estava dura. Ignorei assim como Joel este fato e
continuamos a escalada normalmente. Joel armou a segurança e me recolheu até a entrada do teto onde armei a segurança para ele continuar a escalada (foto: André fazendo a segurança para Joel). Neste momento começamos a comentar o estado da corda e o
barulho que ela fazia ao passar no Oito (equipamento de segurança utilizado na
época), já não sabíamos o que fazer, depois de alguma conversa e de estarmos
quase na metade da escalada resolvemos continuarmos até o final, pois, a chance
de uma queda eram mínimas dada a grande quantidade de grampos da via. Era um
artificial e chegamos ao livro de cume sem problemas. Neste momento
já pensávamos seriamente no que estávamos fazendo e quais poderiam ser as
consequências deste ato, porém, não havia mais volta, precisávamos encarar o
rappel de quase 100 metros numa parede de 90º com uma corda que no mínimo
estava muito ruim. Não tínhamos nenhuma outra corda e precisaríamos fazer 5
rappeis até a base da via. Claro, não preciso falar que cada metro que
descíamos era um frio no estomago, pavor, e uma certa taquicardia, pois, o
barulho da corda passando pelos equipamentos era assustador. Felizmente depois
de muita tensão e adrenalina chegamos sãos e salvos na base da via, a corda,
claro foi para o lixo.
![](https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEhqYIcrlSHMaxlUna2GdrymH0vAqLE_xeStzHeiyLkITVF_t7p1lPC3FOY4hSEDARidm3-3LNeqngtnKOPv1mnP2GOBiviKe07_K04qMb1GeJabLG6O9PBh4EdjhorgMtMkbWHsCXcpOls/s320/27-10-1993+-+Phobus+(2).jpg)
Enquanto assinava o livro de cume, pensava seriamente nos
próximos 5 rappeis que precisávamos encarar.
Apesar de não ter acontecido
nenhum incidente, para mim hoje, quando penso nesta situação não consigo pensar
em outra coisa a não ser em um incidente que poderia ter ocasionado um acidente
fatal, pois, de qualquer ponto que sofrêssemos uma queda decorrente do
rompimento da corda, esta queda seria fatal, não haveria segunda chance para
quem estivesse rappelando. Para quem ficasse preso a rocha restaria o desespero
de estar preso a um grampo e só restariam 2 alternativas: esperar por um
resgate que em 1993 poderia demorar dias, pois, quase não haviam escaladores e
seria preciso que alguém ouvisse os gritos desta via que não é próxima da
trilha principal, afinal os telefones celulares ainda não existiam, ou ainda tentar descer grampo a grampo com algumas fitas,
mas, mesmo com todos os grampos da via, isso provavelmente não seria possível.
O fato é que felizmente eu e Joel
tivemos muita sorte neste dia.
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